Uma das maiores celeumas no ramo do Direito Tributário envolve planejamentos tributários devido à sua subjetividade e à ausência de legislação reguladora específica que parametrize as diretrizes a serem observadas pelos contribuintes a fim de que não sejam encaradas como abusivas sob o ponto de vista dos órgãos fiscalizadores da administração pública.
Desse modo, toda e qualquer manifestação dos órgãos julgadores, tanto os administrativos quanto os judiciais, devem ser cuidadosamente estudadas pelos profissionais que atuam diretamente com planejamento tributário, na medida em que desempenham um papel crucial em definir e delimitar as possíveis práticas aceitáveis de planejamentos tributários, evitando-se, assim, eventuais fiscalizações e lavraturas de Autos de Infração.
Nesse cenário, recentemente o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”), órgão colegiado do Ministério da Fazenda, responsável pelo julgamento de recursos de ofício e voluntário de decisão de primeira instância relacionado com tributos administrados pela Receita Federal, por meio dos Conselheiros que compõem a 2ª Turma Ordinária, da 3ª Câmara, da 3ª Seção de Julgamento, julgou favoravelmente ao contribuinte matéria extremamente relevante no âmbito tributário que versa sobre planejamento tributário, processado sob nº. 16327.720206/2020-69, que deu ensejo ao acórdão nº. 3302-014.120.
No bojo do referido Processo Administrativo, discute-se a legitimidade do planejamento tributário praticado pelo contribuinte por meio da verificação de ocorrência de fraude, nos termos do artigo 72 da Lei nº. 4.502/1964, e/ou de simulação, nos termos do artigo 167 do Código Civil, em razão de a companhia não ter oferecido determinadas receitas à tributação pela Contribuição ao PIS e pela COFINS.
Por ocasião do aludido julgamento, o CARF deu provimento ao Recurso Voluntário interposto pelo contribuinte, cancelou a autuação fiscal e reconheceu expressamente que os planejamentos tributários feitos com objetivo de economia tributária são suficientes a embasar e preencher o conteúdo do propósito negocial, sendo desnecessária a existência de mais razões não tributárias para embasamento do negócio jurídico pretendido e realizado.
Esse recente precedente é relevante para as controvérsias administrativas e judiciais relacionadas com planejamentos tributários porquanto contempla diversos argumentos em favor dos contribuintes abaixo sintetizados.
A uma, reconheceu-se que a análise dos planejamentos tributários é subjetiva, de modo que instala aos contribuintes uma enorme insegurança jurídica.
A duas, reconheceu-se que o “propósito negocial”, usualmente adotado em julgamentos para desconsiderar planejamentos tributários, é uma figura construída exclusivamente pela jurisprudência, não havendo respaldo em legislação vigente.
A três, o aludido acórdão, de maneira brilhante e se valendo de argumentos utilizados pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 2.446, evidenciou que não há qualquer proibição na legislação tributária para que o contribuinte, munido de duas opções igualmente e juridicamente válidas, opte por aquela que implica em maior economia tributária.
A quatro, o mencionado acórdão deixa claro que não cabe à Fiscalização intervir nas escolhas dos gestores da pessoa jurídica, sob pena de afronta direta à liberdade empresarial, à auto-organização e às garantias constitucionais da livre
iniciativa, não podendo, ainda, determinar e insinuar a direção que deveria ter sido tomada para operacionalizar o grupo empresarial e os respectivos investimentos.
Insta ressaltar que o aludido julgamento do CARF também considerou o cumprimento por parte do contribuinte de todas as normas jurídicas, contábeis e fiscais.
Como regra em julgamentos administrativos de tributos federais relacionados com planejamento tributário, o CARF se aprofunda sobre os objetivos detidos nas operações praticadas pelos contribuintes, desconsiderando os planejamentos tributários que apresentam exclusivamente como propósito a obtenção de economia tributária.
Entretanto, com a superveniência do acórdão nº. 3302-014.120, é possível verificar o surgimento de uma nova corrente jurisprudencial sobre o que se entende por planejamento tributário legítimo, de modo que a justificativa de economia tributária é suficiente para sustentar a validade jurídica do planejamento tributário, desde que igualmente cumpridas as respectivas normas jurídicas, contábeis e fiscais pelos contribuintes.
Sobre o Autor: Rafael do Nascimento Alarcon Villalba é advogado tributarista e contador; Pós-graduado em Direito Tributário Brasileiro pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (2023); Bacharel em Ciências Contábeis pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2021); Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2019); e-mail para contato: villalba.advcontador@gmail.com