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Direito tributário

Reflexo do Tema 962 do STF: Não Incidência de PIS-COFINS sobre SELIC

Em 27.09.2021, o Supremo Tribunal Federal (“STF”) julgou o recurso extraordinário (“RE”) nº 1.063.187 (Tema nº 962), tendo fixado o entendimento de não incidir imposto sobre a renda (“IR”) – seja da pessoa física (“IRPF”), seja da pessoa jurídica (“IRPJ”) – e nem contribuição social sobre o lucro líquido (“CSLL”) sobre juros e atualização monetária (tal como é a Taxa SELIC) em razão de não se tratar de renda ou lucro dos contribuintes, mas, sim, mera recomposição de seu patrimônio ante a demora no recebimento de valores que lhe eram de direito.

Ocorre que, sempre que o STF se manifesta favoravelmente aos contribuintes em determinada matéria, passa-se a verificar se tal entendimento pode ser aplicável em outras discussões encampadas pelos sujeitos passivos. E é o que ocorre no caso da aplicação do Tema 962 do STF (não incidência de IR e CSLL sobre juros e atualização monetária) para a contribuição ao programa de integração social (“PIS”) e para a contribuição para financiamento da seguridade social (“COFINS”) – ou apenas “PIS/COFINS” – e, por conta disso, passa-se a verificar se a tese fixada pela Suprema Corte pode ser utilizada para defender a não incidência das referidas contribuições.

Inicialmente, faz-se necessário compreender qual o conceito constitucional de receita bruta (base de cálculo de PIS/COFINS) – visto que a Constituição Federal, na alínea “b” do inciso I de seu artigo 195, outorgou competência à União Federal para instituição de contribuição social sobre a receita ou faturamento – para entender se tais contribuições devem (ou não) incidir sobre juros e correção monetária (exemplo, a Taxa SELIC).

Embora o conceito contábil de receita bruta compreenda todo ingresso financeiro  percebido pela pessoa jurídica – e apenas após deduções, chega-se nos conceitos de receita líquida e lucro –, o STF, em 15.03.2017, quando do julgamento do RE nº 574.706 (Tema nº 69), ao definir que o imposto sobre operações de circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transportes e de comunicações (“ICMS”) não integra a base de cálculo de PIS/COFINS, definiu qual o conceito constitucional (jurídico-tributário) da receita bruta, delimitando que seu conceito é diverso de seu conceito contábil.

Naquela oportunidade, a Suprema Corte, como se vê, por exemplo, do voto do Ministro Celso de Mello, manifestou o entendimento de que a expressão “receita” implica em ingresso no caixa da empresa que represente uma variação positiva no seu patrimônio, ou seja, algo que se consubstancie como um acréscimo patrimonial.

Em igual sentido, o Plenário do STF, quando do julgamento do RE nº 606.107 (Tema nº 283) – que trata da não incidência de PIS/COFINS sobre os valores auferidos pelas empresas exportadoras em razão da transferência a terceiros de créditos de ICMS –, já havia declarado inconstitucional tal exigência porque, nos termos do voto Ministra Relatora Rosa Weber, o conceito constitucional de “receita” corresponde a um “ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições”.

Por conta disso, o que se verifica atualmente é que o STF definiu o conceito constitucional (jurídico-tributário) de “receita” como sendo distinto de seu conceito contábil, tendo fixado que, para fins de incidência de PIS/COFINS, um determinado valor, para ser considerado como sendo “receita”, ele deve preencher dois requisitos (e o não preenchimento de um deles já basta para que tal valor não se enquadre como “receita”), quais sejam (i) ser um elemento novo e positivo, e (ii) não deve possuir reservas ou condições.

Feita tal conceituação (baseada no atual posicionamento do STF – exarado em sede de repercussão geral), nota-se que os juros de mora e a correção monetária (como é o caso da Taxa SELIC) não preenchem o primeiro dos requisitos acima elencados, visto não se tratar de um elemento novo e positivo.

Muito pelo contrário. Os valores relativos a juros de mora e atualização monetária (como é a Taxa SELIC) representam mera recomposição da quantia que o contribuinte faz jus receber, preservando o poder de compra da moeda que, pouco a pouco, foi perdendo valor pela inflação, permitindo, com isso, que o contribuinte não venha a receber, efetivamente, uma quantia inferior àquela que ele tem direito em razão da demora na devolução de tais valores.

Tanto é assim que o parágrafo único do artigo 404 do Código Civil reconhece que os juros de mora possuem natureza jurídica indenizatória, o que foi devidamente reconhecido pelo STF quando do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (“ADIn”) nº 2.322 – tendo o Ministro Relator Luís Roberto Barroso manifestado que os juros compensatórios possuem caráter indenizatório, visto que tal valor “compensa alguém que foi desapossado” – e foi reiterado no próprio Tema nº 962 que declarou inconstitucional a incidência de IR e CSLL sobre a SELIC.

Frise-se que a natureza indenizatória dos juros de mora e da atualização monetária também é uníssona na doutrina, tal como compreende Amilcar Falcão¹, Sílvio Rodrigues² e João Dácio Rolim³.

Assim, os juros de mora e a atualização/correção monetária (como é a SELIC), por possuírem natureza jurídica indenizatória, não são elementos novos e positivos – visto que tais valores se prestam a recompor o patrimônio perdido pela inflação –, e, por conta disso, não integram o conceito constitucional (jurídico-tributário) de receita bruta, não sendo, portanto, tributáveis por PIS/COFINS.

Tanto é assim que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (“TRF-3”), quando do julgamento do agravo de instrumento nº 5022813 76.2021.4.03.0000, manifestou-se no sentido de o leading case do STF (Tema nº 962) ser aplicável por analogia também para PIS/COFINS, não incidindo, portanto, tais contribuições sobre os juros e a atualização monetária de valores (tal como é a Taxa SELIC).

Inclusive, essa decisão do TRF-3 foi analisada por Ricardo Elias Chahine no “EBT Comenta”, de 31 de outubro de 2021.

Desta feita, conclui-se que os juros de mora e a atualização/correção monetária (como é a Taxa SELIC) não devem ser tributáveis por PIS/COFINS, visto se tratar de valores que possuem natureza jurídica de indenização, não compreendendo elementos novos e positivos, mas, sim, mera recomposição do patrimônio perdido pela inflação ante a demora na devolução da quantia que é devida ao contribuinte.

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¹ in Revista Direito Público, vol. I, pp. 54-63

² in Direito Civil, Parte Geral das Obrigações, de acordo com o novo Código Civil – Lei n. 10.406, de 10-1-2002, Volume 2, Editora Saraiva, 30ª Edição, p. 235

³ in Grandes Questões Atuais do Direito Tributário, 2º Volume, Dialética, p. 198

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Sobre o autor:

Bruno Romano é advogado tributarista, Sócio do BCOR | Bonaccorso, Cavalcante, Oliveira e Ristow Advogados, e Professor do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários de São Paulo – IBET/SP, é mestrando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET; é pós-graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT; tem extensão em Teoria Geral do Direito, em ICMS, em Contabilidade e em Processo Tributário pelo IBET; tem extensão em Tributação Indireta e em Contabilidade pelo Instituto de Estudos Tributários – IET; e é bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; e-mails: bruno.romano2000@gmail.com, bruno.romano@adv.oabsp.org.br e bromano@bcor.adv.br

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