Após tantos anos de espera, a emblemática tese da limitação da base de cálculo das contribuições de terceiros a 20 salários-mínimos teve seu julgamento iniciado pelo STJ.
Na oportunidade, contribuintes defendem que os artigos 1º e 3º do Decreto-Lei n. 2.318/1986 revogaram o caput do artigo 4º da Lei n. 6.950/1981, enquanto seu parágrafo único permanece válido, vigente e eficaz.
Com isso, a limitação da base de cálculo foi revogada apenas para as contribuições previdenciárias, de modo que as bases de cálculo das contribuições de terceiros devem ser limitadas a 20 salários-mínimos.
Inclusive, vale salientar que esse tema já foi objeto de artigo publicado pela Escola Brasileira de Tributos, como se vê dos textos de autoria de Bruno Romano, de 16.04.2022 e de 13.04.2022.
Contudo, o voto da Ministra Relatora, Dra. Regina Helena Costa, foi desfavorável aos contribuintes, visto que ela compreendeu que os artigos 1º e 3º do Decreto-Lei n. 2.318/1986 promoveram a revogação do caput e do parágrafo único do artigo 4° da Lei n. 6.950/1981.
Com isso, houve a revogação da limitação da base de cálculo tanto das contribuições previdenciárias quanto das contribuições de terceiros, já que o parágrafo de um artigo não poderia seguir válido, vigente e eficaz quando seu caput já foi revogado, em função da pretensa "interdependência" daquele para com esse.
Apesar do respeito ao posicionamento firmado no voto de relatoria, discorda-se de seu entendimento.
Isso, porque, apesar de a Lei Complementar n. 95/1998 (que disciplina sobre a elaboração de Leis no Brasil) dispor que os parágrafos dos artigos expressarão "os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida", o presente caso trata de normas anteriores à mencionada Lei Complementar (normas da década de 80), sendo possível que parágrafo e caput tratem de matérias autónomas.
Além disso, vale salientar que o Decreto-Lei n. 2.316/1986 disciplina sobre matéria específica ao dispor que, para “efeito do cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo art. 4º da Lei nº 6.950, de 4 de novembro de 1981”.
Ou seja, se a norma disciplina expressamente sobre “contribuição da empresa para a previdência social”, não se faz plausível que a norma revogue também a limitação da base de cálculo das contribuições de terceiros, já que são tributos diferentes, distintos, não sendo possível que uma norma que trate de um tributo cause impactos em outro tributo.
Isso, porque, se esse entendimento fosse permitido, estar-se-ia admitindo a majoração de um tributo (contribuições de terceiros) por meio de uma norma que trata de outro tributo (contribuições previdenciárias), de modo que tal majoração não terá previsão em lei específica para aquele tributo, o que viola o princípio da estrita legalidade tributária, insculpido no inciso I do artigo 150 da Constituição e nos incisos I e II do artigo 97 do CTN.
Além disso, como a majoração de um tributo (contribuições de terceiros) se dará pela interpretação analógica de uma norma que trata de outro tributo (contribuições previdenciárias), está-se instituindo uma relação jurídica por meio de analogia, em violação ao § 1º do artigo 108 do CTN.
Por conta disso, apesar do respeito que se nutre ao entendimento firmado pelo voto de relatoria, discorda-se, data venia, de tal posicionamento.
Pois bem. Após a prolação do voto da Ministra Relatora, o Ministro Mauro Campbell Marques pediu vista dos autos. Agora, com base nos pontos acima elencados, fica-se a torcida para que os demais Ministros venham a discordar do voto de relatoria para formar maioria em favor dos contribuintes.